
Escritos & Retratos
Acadêmico cria protótipo que auxilia deficientes visuais na locomoção
O projeto é inovador e já conquistou premiações e menção honrosa na área da tecnologia assistiva. Um dos diferenciais da proposta apresentada é a utilização de vibrações táteis.

A tecnologia ao longo do tempo já apresentou diversos dispositivos que mudaram o cotidiano de milhões de pessoas. E quando o assunto é inclusão,vale a pena ressaltar os reflexos disso para uma melhor qualidade de vida dos portadores de deficiência, e é exatamente nesse âmbito que entra a Tecnologia Assistiva(TA). De forma geral, TA é todo arsenal de recursos e serviços que contribuem para proporcionar ou ampliar habilidades de pessoas com deficiência e idosos, gerando assim inserção e uma vida mais independente.
O uso do bastão de hoover, popularmente conhecido como Bengala Longa, é primordial para que os portadores de deficiência visual consigam se locomover de forma mais segura. Porém, nem sempre apenas com o uso da bengala é possível perceber um obstáculos a frente, ou quando isso ocorre, já é tarde demais para mudar de direção. Pensando nisso, Victor Gomes, acadêmico do curso de Engenharia Elétrica na Universidade Federal do Amapá, UNIFAP, criou um protótipo para emitir sinais táteis de alerta para assim evitar
incidentes.
A pesquisa começou com a criação de um grupo denominado Grupo de Embarcados,Automação e Robótica (GEAR), coordenado pelo professor,Rafael Comesanha. O objetivo do grupo era desenvolver estudos, projetos e dispositivos
voltados para a acessibilidade.
“A primeira etapa foi saber quais as tecnologias existentes,quais as semelhanças, o que existia com a mesma finalidade, com o mesmo intuito e após isso pensar em um dispositivo que teria a mesma função, mas que fosse diferente”, afirma Victor.

Victor Gomes
Após essa etapa foi pensada a construção do protótipo,fazendo o uso de uma plataforma de prototipagem eletrônica de hardware livre “Arduino mini”, um sensor de ultrassom HC-sr04, o qual mede distâncias de 2 centímetros a 4 metros, e um motor vibra-call. Com o dispositivo em mãos, hora de partir para os primeiros testes, realizados com duas mulheres adultas portadoras de deficiência visual, sendo uma com baixa visão e outra com cegueira. A sessão ocorreu nas dependências da UNIFAP e teve o
acompanhamento da professora Leila Feio, coordenadora do Núcleo de Inclusão e Acessibilidade (NAI) , as respostas foram as melhores possíveis.
“Os relatos das duas pessoas que participaram dos testes foi muito positivo e isso motivou bastante a continuar com o projeto.Esses feedbacks foram importantes:- Ah melhora isso aqui! A vibração está muito baixa. Então foram retornos técnicos que a gente está tentando fazer os ajustes e voltar parauma nova fase de testes, talvez ano que vem”, conta Rafael.
Prof° Rafael Comesanha
Vários estudos já comprovaram que a audição dos deficientes visuais é bem mais aguçada em relação às pessoas que podem enxergar, por esse motivo esse sentido é muito usado por eles. Pensando em não sobrecarregá-lo, Victor propõe no dispositivo o recebimento de alertas através de vibração, configuradas em quatro níveis: leve, moderada, alta e pulsante. “Tem muitos dispositivos semelhantes mas eles usam a resposta audível, então por quê não ajudar a fazer com que o deficiente visual saiba o que tem ao redor dele através do tato? Isso inclusive era um diferencial, porque não usava nada sonoro e dava uma resposta a mais através do tato dele”, afirma Victor.
Izaac Ribeiro é deficiente visual e ao sair nas ruas sempre conta com ajuda de alguém, embora dentro de casa seja totalmente independente.Faz uso da bengala desde os dez anos de idade,mas por diversas vezes já colidiu com vários objetos durante o trajeto, acredita no potencial do protótipo criado.
“Esse dispositivo é muito importante para nós, ele seria muito útil porque nós que temos essa deficiência, em um ambiente novo não temos uma certa noção, então, daria mais independência, autonomia”, diz Izaac.

Izaac Ribeiro
Durante a pesquisa foram muitos os desafios, um deles foi em virtude da falta de investimentos para custear as atualizações do protótipo, mas Victor evidencia o maior desafio. “O maior desafio foi tentar entender como era a vida dos deficientes visuais. Não é simplesmente colocar uma venda nos olhos e achar que é assim. É como fazer uma roupa para uma pessoa que você não conhece e queira que dê certo.Tive que conhecer os deficientes visuais, tive que saber quais as dificuldades, os diversos tipos, a própria psicologia, como eles lidam com o dia a dia.Fui orientado pela professora Leila em como lidar, ela me ajudou a desenvolver uma metodologia para usar o produto”.
Após a validação das participantes que testaram o sistema, algumas sugestões de melhorias foram feitas e agora o passo a ser dado diz respeito a uma conectividade com o celular, aumentando assim a quantidade de funcionalidades e comunicação com o próprio usuário. “Do meu ponto de vista é factível, a gente consegue fazer. Estamos mesmo na pesquisa ainda, vamos desenvolvendo e testando, só que precisamos testar com mais pessoas para ter mais feedbaks e poder dizer:-Olha realmente tem potencial e é um bom dispositivo, é
diferencial!”, conta Rafael.
Devido a correria do dia a dia e as muitas ocupações, Victor Gomes acabou ficando sem tempo para prosseguir com as pesquisas e atualmente um outro acadêmico decidiu avançar com os estudos.” Eu optei pela minha carreira profissional, tentei conciliar mas fica muito complicado. Eu não segurei o projeto para mim, deixei em aberto quem quisesse abraçar, estava disposto a tirar dúvidas , ajudar, informar tudo o que fiz, repassar a documentação e que a pessoa possa levar em frente. O importante é que quem tome a frente, consiga levar o mais alto possível, esse é o objetivo”, fala Victor.
A pesquisa científica sem dúvidas contribui para o desenvolvimento de uma sociedade e promoção na qualidade de vidas das pessoas, e nesse sentido, todos ganham, como afirma Izaac.”Esses estudos são essenciais tanto para um lado quanto para o outro. O primeiro que vou priorizar é o lado acadêmico, já existiram muitos deles que acabaram descobrindo e criando novas tecnologias assistivas, novos recursos para pessoas com deficiência. Então quando um acadêmico começa a pesquisar essa área pode contribuir e inovar. E pela nossa questão é a respeito da acessibilidade e autonomia”.